Está se tornando popular o termo prática contemplativa, especialmente em sua versão conhecida como meditação. Com a popularização da Internet, cada vez mais pessoas se propõem a ensinar aquilo que acham que sabem. Há vários problemas envolvidos aqui, talvez o pior deles seja o autodidatismo.
É possível aprender muita coisa sem um professor (mas lendo livros escritos por um), tais como matemática, história, biologia, xadrez, etc. Mas quando se trata de assuntos de espiritualidade e autoconhecimento, só por milagre um autodidata chega a algum lugar. No máximo, o que vai acontecer é a pessoa se tornar o acadêmico insoso que já leu todos os livros e artigos sobre meditação e eletroencefelagrafia mas não é capaz de ficar sentado de olhos fechados por cinco minutos numa almofada.
Às vezes aparece algum autointitulado conhecedor da sabedoria indiana querendo participar de grupos de estudo e meditação mas quando questionado sobre suas práticas pessoais, no máximo o que ele faz é ver vídeos no youtube e ler livros de mestres Pop.
Aqui entra mais uma tentativa de esclarecer equívocos: mais de 99% do que você vê e ouve por aí sobre meditação, não é meditação. Nessa hora lembro da literatura barata que eu lia na adolescência e que só recentemente meu professor me questionou usando como exemplo aquela literatura:
- Você acredita realmente que um ninja escreveria um livro entitulado: Os Segredos do Ninja ?
Agora, pare e pense, você realmente acredita que um grande mestre tradicional iria escrever num livro todos os segredos de uma tradição milenar. Em primeiro lugar, algumas práticas não se aprendem lendo, pois é necessário que alguém que as saiba observe você praticando e te corrija. Por exemplo, a prática de mantras. A maior tentação nossa hoje é buscar algum cardápio de mantras na Internet, escolher aquele que mais nos agrada, de preferência em texto transliterado e depois procurar no Youtube ou em outra plataforma alguém cantando o mantra para tentarmos aprender olhando a transliteração e ouvido a pessoa cantar.
Daí decorrem muitos problemas, por exemplo, a questão dos sons nasais no sânscrito. As palavras escritas em sânscrito mudam seus caracteres e quando vão ser cantadas podem mudar sua sonoridade de acordo com regras bem específicas. Assim, o que acontece geralmente é você vê no texto um caractere mas a pessoa que você está ouvindo no Youtube não pronuncia aquele caractere. O que fazer? O autodidata vai procurar outro vídeo em que a pessoa pronuncie o caractere. Mas qual a forma correta? Em princípio, o autodidata não vai saber, vai procurar cinco versões diferentes do mesmo cântico e fazer uma votação pela maioria das pronúncias escolhendo a que ele supõe que seja a correta. Já imaginou a bagunça e a demora que essa vai ter pra aprender um mantra ou um cântico?
Voltemos a meditação. A maioria das abordagens populares ensinadas, são técnicas de concentração de influência predominantemente budista. São uma tentativa de facilitar a vida das pessoas modernas que não conseguem nem ficar sentadas na almofada. Então, as técnicas de concentração vendidas como meditação vão dizer: perceba a sua respiração, preste atenção quando estiver comendo alguma coisa, etc.
Acontece que as práticas mais profundas de meditação utilizam mantras, cânticos e visualização. O processo de repetir mantras e cânticos seguindo as regras corretas de entonação e de pronúncia provoca estados mentais que conduzem o praticante a um estado de meditação profunda. As visualizações podem ser de dois tipos principais: visualização da deidade e visualização de determinados aspectos espirituais no próprio corpo.
Mas é claro que um mestre não vai sair por aí ensinando essas práticas para qualquer pessoa. Assim como tudo na vida, um caminho deve ser trilhado antes de chegar a práticas, supostamente, mais avançadas. Em primeiro lugar, o básico deve ser dominado: aprender a sentar imóvel por alguns minutos, por exemplo, e a aprender a pronúncia do sânscrito. Em segundo lugar, o mestre deve perceber a dedicação e devoção do aluno ao caminho que está trilhando. Se houver um mero interesse superficial, os segredos não serão revelados.