Tradução do sutra 12 do pada 1 do Yoga Sutra de Patanjali. Para visualizar a tradução de outros sutras, clique neste link: https://www.cienciacontemplativa.com.br/2018/07/14/traducao-detalhada-yoga-sutra/
Sutra em sânscrito: अभ्यासवैराग्याभ्याम् तन्निरोध:
Tradução palavra por palavra
अभ्यास => masculino. Significado: exercício, disciplina, prática.
वैराग्याभ्याम् => neutro, 3 caso, singular. Significado: Com desapego.
अभ्यासवैराग्याभ्याम् => itaretara dvandva samasa. Significado: com desapego e disciplina.
तत् => pronome. Significado: esse, aquele, isso, o.
As práticas mais profundas de meditação utilizam mantras, cânticos e visualização. Mas é claro que um mestre não vai sair por aí ensinando essas práticas para qualquer pessoa. Assim como tudo na vida, um caminho deve ser trilhado antes de chegar a práticas, supostamente, mais avançadas.
Está se tornando popular o termo prática contemplativa, especialmente em sua versão conhecida como meditação. Com a popularização da Internet, cada vez mais pessoas se propõem a ensinar aquilo que acham que sabem. Há vários problemas envolvidos aqui, talvez o pior deles seja o autodidatismo.
É possível aprender muita coisa sem um professor (mas lendo livros escritos por um), tais como matemática, história, biologia, xadrez, etc. Mas quando se trata de assuntos de espiritualidade e autoconhecimento, só por milagre um autodidata chega a algum lugar. No máximo, o que vai acontecer é a pessoa se tornar o acadêmico insoso que já leu todos os livros e artigos sobre meditação e eletroencefelagrafia mas não é capaz de ficar sentado de olhos fechados por cinco minutos numa almofada.
Às vezes aparece algum autointitulado conhecedor da sabedoria indiana querendo participar de grupos de estudo e meditação mas quando questionado sobre suas práticas pessoais, no máximo o que ele faz é ver vídeos no youtube e ler livros de mestres Pop.
Aqui entra mais uma tentativa de esclarecer equívocos: mais de 99% do que você vê e ouve por aí sobre meditação, não é meditação. Nessa hora lembro da literatura barata que eu lia na adolescência e que só recentemente meu professor me questionou usando como exemplo aquela literatura:
Você acredita realmente que um ninja escreveria um livro entitulado: Os Segredos do Ninja ?
Agora, pare e pense, você realmente acredita que um grande mestre tradicional iria escrever num livro todos os segredos de uma tradição milenar. Em primeiro lugar, algumas práticas não se aprendem lendo, pois é necessário que alguém que as saiba observe você praticando e te corrija. Por exemplo, a prática de mantras. A maior tentação nossa hoje é buscar algum cardápio de mantras na Internet, escolher aquele que mais nos agrada, de preferência em texto transliterado e depois procurar no Youtube ou em outra plataforma alguém cantando o mantra para tentarmos aprender olhando a transliteração e ouvido a pessoa cantar.
Daí decorrem muitos problemas, por exemplo, a questão dos sons nasais no sânscrito. As palavras escritas em sânscrito mudam seus caracteres e quando vão ser cantadas podem mudar sua sonoridade de acordo com regras bem específicas. Assim, o que acontece geralmente é você vê no texto um caractere mas a pessoa que você está ouvindo no Youtube não pronuncia aquele caractere. O que fazer? O autodidata vai procurar outro vídeo em que a pessoa pronuncie o caractere. Mas qual a forma correta? Em princípio, o autodidata não vai saber, vai procurar cinco versões diferentes do mesmo cântico e fazer uma votação pela maioria das pronúncias escolhendo a que ele supõe que seja a correta. Já imaginou a bagunça e a demora que essa vai ter pra aprender um mantra ou um cântico?
Voltemos a meditação. A maioria das abordagens populares ensinadas, são técnicas de concentração de influência predominantemente budista. São uma tentativa de facilitar a vida das pessoas modernas que não conseguem nem ficar sentadas na almofada. Então, as técnicas de concentração vendidas como meditação vão dizer: perceba a sua respiração, preste atenção quando estiver comendo alguma coisa, etc.
Acontece que as práticas mais profundas de meditação utilizam mantras, cânticos e visualização. O processo de repetir mantras e cânticos seguindo as regras corretas de entonação e de pronúncia provoca estados mentais que conduzem o praticante a um estado de meditação profunda. As visualizações podem ser de dois tipos principais: visualização da deidade e visualização de determinados aspectos espirituais no próprio corpo.
Mas é claro que um mestre não vai sair por aí ensinando essas práticas para qualquer pessoa. Assim como tudo na vida, um caminho deve ser trilhado antes de chegar a práticas, supostamente, mais avançadas. Em primeiro lugar, o básico deve ser dominado: aprender a sentar imóvel por alguns minutos, por exemplo, e a aprender a pronúncia do sânscrito. Em segundo lugar, o mestre deve perceber a dedicação e devoção do aluno ao caminho que está trilhando. Se houver um mero interesse superficial, os segredos não serão revelados.
Este curso será realizado em 2 encontros de um dia cada, totalizando cerca de 16 horas de aula. As aulas serão teóricas e práticas e haverá apostilas e exercícios a serem realizados pelos participantes. Ao fim do curso será emitido certificado para aqueles que realizarem todos os exercícios propostos. Deve-se ressaltar que este é o curso básico (não envolve gramática nem vocabulário extenso) e garante-se que se o método for seguido o aluno será capaz de ler e escrever em sânscrito usando Devanāgarī.
Afinal ,a pronúncia do sânscrito é importante ou não para recitar mantras?
Quando se trata de recitar mantras, cânticos e versos da língua sânscrita (língua antiga indiana em que a maior parte dos textos védicos, yoguis e tântricos estão escritos) como uma prática espiritual devemos considerar dois fatores:
A pronúncia não é importante;
A pronúncia é importante.
Se a pessoa não considera importante a pronúncia correta, por quais motivos ela estaria interessada em recitar o mantra? Pra quê recitar? Só para estar na moda? Não faz o menor sentido a pessoa querer repetir frases em outro idioma se considera que a pronúncia correta não é importante. Se a pessoa quer recitar mantras como prática espiritual e não sabe ou não quer aprender a pronúncia do sânscrito seria melhor ela obter a tradução do mantra que deseja e o repetir em seu próprio idioma.
Mas se a pessoa deseja repetir mantras como prática espiritual e concorda com a tradição no fato de que a pronúncia é importante, algumas orientações devem ser seguidas:
Para recitar corretamente é importante que a pessoa saiba pronunciar os sons do alfabeto sânscrito que inclui sons que não estão presentes no português. Por exemplo, sons em que se coloca a ponta da língua no céu da boca para serem pronunciados.
Tradicionalmente os mantras são passados de mestre a discípulo. É claro que há exceções, mas não deveríamos tomar a exceção pela regra.
A maioria das pessoas não possui boas habilidades auditivas a ponto de perceberem mudanças de tons e de pronúncias sozinhas. Para a maioria das pessoas, é necessário que alguém as escute pronunciando os versos para que seja possível apontar possíveis erros.
Mas por que essa preocupação toda com os sons dos mantras. Por motivos bem simples. Vejamos os seguintes exemplos de palavras do sânscrito que possuem sons parecidos mas que possuem significados bastante distintos:
बल (bala) : força, poder;
बाल (bāla): garoto;
बाला (bālā): garota;
भाल (bhāla): testa;
Perceba que a principal diferença entre as três primeiras palavras está na duração da vogal a. Pois o traço horizontal em cima do a indica que ele deve ter pronúncia mais longa do que a sem o traço horizontal. Na quarta palavra, há outra diferença, o som de b é aspirado.
Agora imagine que você está repetindo um mantra pedindo força e está pronunciando a palavra relativa à força como uma das outras três opções. Que desastre, não? Olha que este é um exemplo simples.
Se você quer repetir mantras e não quer aprender ou não sabe a pronúncia do sânscrito. Peça a alguém que sabe que lhe ensine alguma tradução. Ou então, você pode ouvir a gravação do mantra recitado por alguém que saiba.
O verso 4 do Shiva Manasa Puja pode ser cantado separadamente e é conhecido como Invocação Não-Dual. Neste post apresentamos o verso em sânscrito, transliterado e traduzido. Além disso, apresentamos também um áudio com a recitação do verso.
Tu és o Eu, a intuição ,Girijā, a nascida da montanha. A minha força vital é tua companhia. O meu corpo é tua casa. Reverência a ti. A criação é o desfrute do teu reino. O meu sono é a tua permanência em samādhi.
O movimento dos meus dois pés para a direita e para a esquerda são uma cerimônia. Toda palavra é hino de elogio a você. Qualquer que seja a ação que eu faço isso tudo é tua adoração, Oh Senhor Shiva.
Áudio do Verso Recitado
Tradução Detalhada
Primeira parte do verso
आत्मा (ātmā): masculino, nominativo, singular. Significado: eu, uma pessoa.
त्वं (tvaṁ): pronome pessoal de segunda pessoa, nominativo, singular. Significado: tu, você.
गिरिजा (girijā): tatpurusha 6. गिरि + जा . गिरि (giri): palavra feminina. Significado: montanha. जा (jā): palavra feminina, nominativo, singular, significado: nascida. Signficado: nascida da montanha. Esse é um nome para Parvati.
[O] movimento dos [meus] dois pés para a direita [e para a esquerda são uma] cerimônia. Toda palavra [é] hino de elogio [a você]. Qualquer que seja [a] ação [que eu] faço isso tudo [é] tua adoração, Oh Senhor Shiva.
उदच्यते (udacyate) => verbo, terceira pessoa do singular, passivo, presente => é produzido.
पूर्णस्य (pūrṇasya) => neutro, genitivo, singular. Significado: “do” pleno, “do” cheio, “do” completo. Aqui, o signicado de “do” tem sentido de posse. Em pūrṇāt, o sentido é de origem.
Usos e abusos dos mantras numa sociedade em que temos muita informação disponível.
Popularmente, um mantra ( मन्त्र ) é uma frase ou sílaba (bija-mantra) utilizada para orações ou meditações. Originalmente, um mantra é um “verso” dos Vedas. Com o desenvolvimento das tradições indianas conectadas aos Vedas, outros mantras foram revelados aos sábios. Mas um fato importante sobre a “obtenção” de mantras é que ou você é um sábio bastante realizado capaz de receber diretamente o mantra de Ishvara/Ishvari ou você precisa de um professor que te passe o mantra adequadamente.
É aí que começa a confusão. Primeiro, nos dias de hoje poucos são aqueles que dedicam sua vida integralmente ao Yoga ou ao autoconhecimento e praticam intensamente meditação, tapas, rituais e etc. Portanto, a probabilidade de existirem sábios por aí recebendo mantras por inspiração divina nos dias de hoje é bem baixa, embora não possamos excluir essa possibilidade. Segundo, com a popularização da Internet e do acesso à informação existe uma grande quantidade materiais dizendo que ensinam mantras. Esses materiais variam desde livros e vídeos no Youtube a cursos online. Então, já que é “tão fácil” ter acesso aos mantras hoje, por que não íriamos simplesmente ao Youtube, digitamos o objetivo para o qual queremos o mantra e o aprendemos? Por exemplo, suponha que alguém quer um mantra para arranjar um casamento. Ela poderia ir num dos oráculos dos tempos modernos e digitar “Mantra para arranjar marido”, escolher dentre os fundos musicais disponíveis e começar a repetir o mantra.
É claro que muitos de nós já tentamos acessar o conhecimento dos mantras pelo Google, mas pense bem, você realmente acha que um grande sábio conhecedor de mantras vai estar distribuindo mantras pelo Youtube? Não podemos negar a grande quantidade de trabalhos de qualidade sobre Yoga e Tradição Védica existente na Internet. Mas o fato de um professor explicar o significado de um mantra e cantar ele no Youtube para você ouvir não quer dizer que ele está te dando autorização para repetir o mantra. O fato dele estar explicando o mantra poderia ser apenas para fins de divulgação da tradição. Mas, como sempre, pense bem. Será que isso que está sendo recitado é realmente um mantra?
Uma coisa que tem acontecido muito nos dias de hoje é chamarmos qualquer frase recitada em uma língua estranha de mantra. Quando na verdade, o que está sendo recitado pode ser um cântico, um hino, um verso poético, etc.
Alguns fatores que devemos considerar se quisermos realmente aprender mantras do modo tido como tradicional:
Mantras ou cânticos da tradição védica são recitados em sânscrito;
No sânscrito existem sons que não fazem parte da língua portuguesa;
Tradicionalmente, a pronúncia correta do mantra é de extrema importância. Até por que há palavras em que a diferença entre uma vogal curta e uma vogal longa mudam o significado pretendido. Por exemplo: bala com o primeiro a curto significa força, bAla com o primeiro a longo significa criança ou garoto.
Tradicionalmente, um mantra que não tenha sido ativado por um praticante sério é considerado “morto”. Portanto, se você vai num “manual de mantras” e seleciona um que você quer e o repete, provavelmente estará perdendo seu tempo. O pior é que depois vai sair falando que mantra não funciona.
Não sabemos qual mantra é melhor para nós, apenas uma pessoa qualificada pode indicar e te passar um mantra.
Não é por que você acabou de aprender um mantra de seu professor que você já vai falar ele pros outros ou ensiná-lo a outras pessoas.
Por fim, toda tradição merece respeito. Um dos motivos pelos quais as tradições espirituais indianas se perpetuaram por milênios foi o respeito que os praticantes tinham por ela. Portanto, se você sai por aí balbuciando frases sem sentido pra você e que você não tem certeza se está falando corretamente e que foi você que escolheu em algum livro ou no Youtube, deveria repensar seu conceito de respeito por uma tradição.
Obs.: Tudo que foi exposto acima não exclui a possibilidade de acesso a mantras por inspiração divina.